Conversas em txt
Para finalizar o quadro dos mecanismos potencializadores do diálogo, temos que visitar o mundo sem fio novamente, mais especificamente, a tecnologia de SMS (short message service). Como já mencionamos anteriormente, essa tecnologia ganhou ampla adesão, especialmente na Europa. Em 2001, mais de 200 bilhões de mensagens foram enviadas. [Costa 2002:75] As limitações expressivas da interface, também anteriormente mencionadas, como o tamanho da mensagem, a tela pequena, a digitação alfabética no teclado numérico, não parecem ser grandes obstáculos diante da possibilidade de manter a conexão contínua, quando em movimento, longe dos espaços doméstico e de trabalho.
95% das mensagens de SMS correspondem a p2p messaging, ou seja, diálogos (ver www.mbusinessdaily.com/story/WORLDWATCH/MBZ20020313S0004). Ao contrário dos aplicativos de IM, a maior parte dos usuários não conta com funcionalidades facilitadoras do controle de disponibilidade, aplicativos para envio de mensagens para múltiplos destinatários ou com possibilidade de envio de ícones expressivos. É tudo tão simples quanto: telefone do destinatário + mensagem + botão de enviar. Mais intrigante é o fato de isso ser feito através de um telefone que permitiria também uma ligação telefônica para a mesma pessoa a quem envio a mensagem de texto.
A razão deste mistério é comportamental. Como afirma Rogério da Costa, “a revolução real na computação sem fio não é comercial nem tecnológica, mas social.” [Costa 2002:74] Uma rápida pesquisa feita por motivos profissionais no início de 2002, revela motivações curiosas para a utilização da tecnologia por seu principal público, os jovens entre 15 e 25 anos: “no bar não dá para conversar mas é possível teclar”; “posso combinar uma balada sem que meu pai me ouça”; “quando estou na aula não posso atender o celular, mas dá para ver a mensagens e responder escondido”, “eu estou no trabalho e não dá para atender o telefone, a mensagem chega e fica lá até que eu posso ver, se for urgente respondo senão deixo para depois” e assim vai. Na maioria dos países, o custo de um SMS é também bastante inferior ao de uma ligação. No Brasil, alguns operadores ainda cobram um valor excessivo.
O mais recente livro de Howard Rheingold, Smart Mobs, trata da nova revolução social ocasionada pela comunicação instantânea (este livro não foi incluído na bibliografia deste trabalho, mas o autor também mantém um blog coletivo, www.smartmobs.com, que foi extensamente consultado). O título smart mobs escolhido por Rheingold opera um duplo sentido, mobs como abreviação de mobile phone, fazendo referência a tecnologias de comunicação móvel inteligentes, ou à palavra mob propriamente dita, o que traduziria a expressão como “gangues inteligentes”. O segundo sentido me parece mais relevante. É ele que resume os potentes relatos: cidadãos Filipinos organizando, através de SMS, as manifestações que reuniram mais de um milhão pessoas que derrubaram o Presidente Joseph Estrada; os enxames de adolescentes em Shopping Centers de Helsinque que combinam os encontros relâmpagos via SMS [Costa 2002:77]; e a utilização de SMS pelas ONG responsáveis pela manisfestação de 15 de fevereiro 2003 contra a invasão norteamericana no Iraque.
A potência interativa dessa tecnologia está na capacidade de engajamento contínuo e simultâneo que é operado pelos aparelhos de comunicação móvel que nos acompanham. Eles criam um mundo imersivo que mantém presentes nossos entes queridos, provocando a confortável sensação de estarmos, permanentemente, em contato. A ligação telefônica também provoca este conforto, em especial em relação à segurança, mas sua interação, obrigatoriamente síncrona, exige um nível de atenção maior. O contato através do texto é menos presente e por isto pode ser mais permanente.
A interação via SMS não se resume a diálogos entre amigos. Uma série de aplicativos são oferecidos pelas operadoras de telefonia móvel. Computadores ligados às plataformas de SMS são capazes de operar programas que criam scripts de diálogo que simulam salas de chat, que enviam títulos de email, que recebem votações como as do programa Big Brother e que viabilizam jogos dos mais variados tipos. Nesta interação, a produção do sentido é claramente dominada pelo pólo de ocupado pela máquina, embora caracterize um diálogo. Podemos dizer que neste caso as possibilidades restritivas da máquina são superadas pelas possibildades extensivas da programação.
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