Os primeiros passos

Traçar histórico das comunidades virtuais não é uma tarefa fácil. Vários desenvolvimentos em separado cruzam-se na linha do tempo e, para cada um deles, poder-se-ia discutir se e quando passaram a constituir comunidades. Um dos primeiros desenvolvimentos a estabelecer caminhos para formações socialmente complexas, via comunicação mediada por computador, reside nas pesquisas de Murray Turoff do New Jersey Innstitute of Technology que levaram ao desenvolvimento do Electronic Information Exchange System (EIES) [Rheingold 1994:Chapter Four]. No meio da década de 70, portanto, pré computador pessoal e pré interfaces gráficas, este sistema, atualmente em sua segunda versão (ver http://www.njit.edu/old/CCCC/eies.html), permitia a organização de conferências eletrônicas, então, utilizadas por pequenos grupos de pesquisadores.

No final na década de 70 e início dos anos 80, vários desenvolvimentos vão cooperar para permitir que grupos dispersos geograficamente constituíssem os diálogos interconectados que levariam à formação de comunidades. O desenvolvimento do protocolo UUCP (unix to unix copy protocol) pelo Bell Laboratories vai permitir constituir redes entre as diversas BBS que começavam a brotar, atraindo os pioneiros usuários dos computadores pessoais [ibidem]. A Fidonet, a Bitnet e Usernet surgem neste período. A primeira foi criada para a troca de arquivos entre milhares de BBS existentes a partir do software Fido. A segunda viabilizava uma rede de emails anterior à Internet. A terceira, que nos importa agora, oferecia o primeiro ambiente público de conferências eletrônicas.

Os newsgroups da Usenet permitem que mensagens particulares sejam distribuídas de acordo com assuntos específicos e disponibilizadas, publicamente, para todos os seus usários. As mensagens são atribuídas por seus autores a grupos, em função dos assuntos a que estes se dedicam. Embora o texto de uma mensagem possa endereçar à pessoa que participa do grupo, a mensagem, em si, é direcionada ao grupo. Esta dinâmica, que é espelhada nos sistemas de conferência eletrônica em geral, viabiliza a comunicação muitos-muitos que é condição primária para o estabelecimento de comunidades virtuais.

O que mais impressiona na Usenet é a sua organização anárquica. Os grupos particulares se vinculam a uma cadeia hierárquica à qual, no entanto, não importa controle, visto que seus administradores, basicamente, definem a formação dos grupos que o descendem na estrutura. Por exemplo, o newsgroup alt.culture.usenet que se dedica a discutir os aspectos culturais dos newsgroups na Usenet é administrado por um de seus usuários cujo principal poder reside no direito de criar outro grupo, como por exemplo, alt.culture.usenet.education, e estabelecer quem será o operador do novo grupo, da mesma maneira que o operador do alt.culture o fez.

A experiência pioneira mais comentada, no entanto, é a comunidade Well (Whole Earth Eletronic Link - ver www.well.com). Estabelecida em 1985 por Stewart Brand, fundador da The Whole Earth Review, um ícone da contra-cultura americana, a Well constituiu uma experiência instigante e surpreendente para seus primeiros habitantes, como demonstra o vívido relato de Howard Rheingold [1994]. Em suas conferências eletrônicas temos os exemplos mais expressivos da potência dos laços sociais que unem pessoas que muitas vezes nunca se viram frente a frente. Como escreve Katie Hafner, em artigo para Wired sobre a comunidade: “history has already decreed The Well to be synonymous with online communication in its best, worst, and, above all, most vital forms.” [1997]